Diário de escritor português produzido na pandemia será editado pela Massangana
Iniciado em 2020, o Diário Visual e Gráfico refletiu temas doloridos e banalidades em meio à maior crise sanitária do mundo
O Diário Visual e Gráfico chegou ao fim no último dia 1º. Publicado pelo premiado escritor português Gonçalo M. Tavares, a parceria com a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) marcou uma colaboração inédita de um dos maiores nomes da literatura lusitana contemporânea com o Brasil. A série contabilizou cerca de 180 capítulos, desde julho de 2020, e renderá um livro publicado pela Editora Massangana, braço editorial da instituição federal. “Conclui-se uma etapa, que é sua divulgação diária. A partir de agora, vem outra da maior importância, que é o planejamento editorial para que este Diário se torne um livro e sintetize com agudeza todo um tempo cheio de tensão e tragédia”, declara o diretor de Memória, Educação, Cultura e Arte, Mario Helio.
Ao longo de sete meses, o escritor fundiu literatura, poesia e elementos organizacionais a relatos sobre a pandemia da Covid-19. Assim, as crônicas da vida cotidiana no intitulado ‘novo normal’ ganharam diagramações inéditas. “A memória de dois anos que extrapola as datas, porque há nessa publicação uma linguagem que é um exercício de prosa poética. Gonçalo M. Tavares construiu com esse diário quase um novo gênero literário”, observa Mario. “Significa um motivo de orgulho para qualquer editora publicar a obra de Gonçalo M. Tavares, a quem toda a crítica e os leitores mais exigentes consideram um dos mais relevantes escritores europeus na atualidade. Não apenas pela variedade e riqueza de sua produção, mas pela originalidade, a inventividade e sentido estético”, finaliza.
Residente em Lisboa, capital portuguesa, o escritor recorda como surgiu a ideia da experiência. “Sempre me interessou esta ideia de colocar os pensamentos e reflexões em um ponto de vista visual. Gosto muito das ideias que se podem ver, das ideias que se podem desenhar”, conta Gonçalo, ao explicar o surgimento do projeto. “O ponto inicial tinha muito a ver com uma tentativa de boicotar a ideia que os gráficos só servem para contabilidade ou mostrar o número de mortos. Houve uma tentativa de mostrar que eles podem ser poéticos, trágicos, narrativos, ficções, material de literatura.”
Muito além dos gráficos, Tavares abordou pautas complexas como xenofobia, dilemas entre a economia e a vida, mortes e a restruturação de um novo planeta em silêncio, ou onde os animais resgataram seus antigos habitats naturais. Com uma escrita pouco óbvia, ele desafiou os leitores a encontrarem os inúmeros sentidos possíveis aos seus diários. “O Diário Visual e Gráfico tentou acompanhar o que estava acontecendo no exterior, mas ao mesmo tempo no interior e aquilo em que eu ia pensando. Ou seja, em primeiro lugar em um diário. Portanto uma espécie de documento do escritor com consigo próprio e também com os acontecimentos. Nesse particular, com a peste”, justifica.
Uma das promessas na literatura de Portugal, Gonçalo desde o início arranca elogios por onde passa. Não à toa, foi reconhecido pelo autor de Ensaio sobre a cegueira, o já falecido José Saramago. Dentre os prêmios que coleciona, destaque para a obra Jerusalém (Caminho, 2004), considerada pelo jornal Público o livro da década e traduzida para mais de 50 países. Com o Diário Visual e Gráfico ampliou os laços com o Brasil. “A colaboração com a Fundaj foi muito importante, esta ideia de uma presença diária e constante marcou qualquer coisa de novo que ainda não tinha feito com o País. Só o fato de um diário ser escrito em Lisboa, sem precisar de tradução e aparecer do outro lado do Atlântico é logo algo muito extraordinário.”
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